A pior doença do cafeeiro – a ferrugem causada pelo fungo Hemileia vastatrix – tem sido controlada com o cultivo de variedades resistentes de cafeeiro, o plantio em áreas de fuga (sobretudo em áreas montanhosas elevadas) e por meio de aplicações de fungicidas. A busca de novas abordagens eficazes e inteligentes de manejo despertou o interesse pelos fungos antagonistas à H. vastatrix como possíveis agentes de controle biológico. Dois trabalhos publicados em 2021 pela equipe coordenada pelo professor do Programa de Pós-Graduação em Fitopatologia Robert W. Barreto destacam a diversidade de fungos antagonistas à ferrugem e mostram o potencial que pode ter para o manejo da doença nas plantações de café arábica no futuro.

“As alternativas usadas no passado esbarram em obstáculos diferentes, como as mudanças climáticas, a quebra da resistência por variantes de H. vastatrix, o custo, e a rejeição da aplicação de pesticidas químicos pelo mercado consumidor por conta de preocupação com a presença de resíduos e impacto ambiental. O controle biológico é uma iniciativa ainda muito pouco explorada, e pode ser muito eficiente”, diz o professor Robert, que desenvolve estudos nesta linha desde 2015. “A gente já tem uma lista bastante numerosa de ‘fungos de interesse’ para o controle biológico da ferrugem. O próximo passo é a avaliação desses fungos em condições de campo”. Para o professor, uma opção envolvendo a combinação de mais de uma espécie de fungo, com antagonismo de natureza diferente contra a ferrugem, tende a oferecer os melhores resultados.

Uma das apostas do grupo é no potencial do Calonectria hemileiae , apresentado no artigo “Elucidando as interações entre a ferrugem Hemileia vastatrix e um micoparasita de Calonectria e o cafeeiro” . Nos testes realizados pelo laboratório, o fungo antagonista foi capaz de inibir em cerca de 80% a germinação da ferrugem. “Este paper é um marco, no meu entendimento, porque é provavelmente a primeira vez que se segue o protocolo para determinar cientificamente que um fungo é patógeno de outro fungo (postulados de Koch)”. E o professor acrescenta: “Quando a gente se aplica esse fungo nos cafeeiros, o efeito é notável. É como se fosse a aplicação de um fungicida. Há muito ainda a ser investigado mas, em princípio, não teríamos problemas com resíduos, danos ambientais ou para o consumidor com tais aplicações”.

Além de micoparasitas, como C. hemileiae, outro grupo de fungos de grande interesse como antagonistas a serem explorados contra a ferrugem do cafeeiro são os fungos endofíticos – adaptados a crescer como parceiros benignos dentro do tecido de plantas do cafeeiro, conferindo proteção para as plantas colonizadas. Fungos, como os pertencentes ao gênero Trichoderma, podem crescer dentro da planta do cafeeiro e funcionar como uma espécie de “guarda-costas microbiano”, produzindo substâncias que inibem a ferrugem, e mesmo o ataque de insetos e outros benefícios para a planta hospedeira. Na publicação “Novas espécies e registros de Trichoderma isolados como micoparasitas e endófitos de café cultivado e silvestre na África”foi relatada a ocorrência de 16 dos potenciais defensores dos cafeeiros encontrados na África. “Os experimentos que temos feito em condições controladas indicam que alguns têm bom efeito de proteção contra a ferrugem” “A possibilidade de termos mudas de cafeeiro levadas ao campo já protegidos por fungos endofíticos é muito atraente. persistentes”.

O potencial dos fungos como agentes de controle biológico chamou a atenção da ONG internacional World Coffee Research , que desde 2015 financiou parte dos estudos realizados no DFP. O Brasil é o maior produtor de café do mundo, a segunda commodity mundial, e a ferrugem continua sendo um dos principais limitantes para a produção de café, desafiando cafeicultores e cientistas há 150 anos.